Em seu discurso de defesa aos senadores na manhã desta segunda-feira (29), a presidente afastada Dilma Rousseff negou que tenha cometido qualquer crime de responsabilidade. Para ela, sua eleição feriu interesses da elite econômica e política que, junto com a imprensa e embasados por uma frágil retórica jurídica, pretendem promover uma ruptura democrática e afastá-la do poder injustamente.
— Receio que a democracia seja condenada junto comigo — disse.
Dilma afirmou que um futuro governo de Michel Temer será usurpador, já que, no presidencialismo, não basta a perda de maioria parlamentar para afastar um presidente, mas sim a ocorrência de crime de responsabilidade grave e comprovado.
— Não é legitimo afastar o chefe de Estado e de governo por não concordarem com o conjunto da obra, é o povo, só o povo, nas eleições. E nas eleições o programa de governo vencedor não foi esse — observou.
Para a presidente afastada, o governo interino, caso seja efetivado, atacará as conquistas obtidos nos últimos anos. Modificações e retiradas de direitos da Previdência Social, a revisão de garantias previstas na Consolidação das Leis do Trabalhos (CLT), avanços importantes para os negros, as mulheres e a comunidade LGBT estarão todos comprometidos pela submissão a princípios ultraconservadores, observou.
Eduardo Cunha
Dilma Rousseff afirmou que o deputado afastado Eduardo Cunha foi um dos artífices para se alcançar o clima político necessário para a desconstituição do resultado eleitoral de 2014, permitindo a abertura do processo de impeachment. A presidente afirmou não ter cedido à “chantagem explícita” para impedir o início do processo de cassação do mandato do deputado.
— Se eu tivesse me acumpliciado com a improbidade e com o que há de pior na política brasileira, eu não correria o risco de ser condenada injustamente. Quem se acumplicia ao imoral e ao ilícito, não tem respeitabilidade para governar o Brasil — alegou.
Antes disso, disse Dilma, os derrotados nas eleições tudo fizeram para desestabilizar o governo eleito, numa afirmação do “quanto pior, melhor”, com um ativismo político que se tornou elemento central para a retração do investimento e para o aprofundamento da crise econômica. Eduardo Cunha foi fundamental para dificultar a aprovação de projetos importantes para o reequilíbrio das contas públicas e para permitir que “pautas bombas” passassem pelo crivo do Parlamento.
— Sem essas ações, o Brasil certamente estaria hoje em outra situação política, econômica e fiscal — opinou.
A força dos que queriam evitar a continuidade da “sangria” de setores da classe política, investigados por corrupção e desvio de dinheiro público também foi essencial para desestabilizar a sua gestão, disse Dilma Rousseff. Segundo a presidente afastada, esse é o preço que ela pagou por permitir, sem qualquer tipo de interferência, o trabalho livre do Ministério Público e da Polícia Federal.
Processo legal
Para Dilma, o processo de impeachment está marcado por desvio de poder. Apesar de respeitar a ritos e prazos, a denúncia não se baseia em uma acusação justa, o que fere a democracia. Não há respeito ao devido processo legal quando a opinião de grande parte dos julgadores é divulgada antes do exercício final do direito de defesa. Nem quando dizem que a condenação não passa de uma questão de tempo, observou.
— Cassar em definitivo meu mandato é como me submeter a uma pena de morte política — disse.
Ela disse se sentir submetida a mais um julgamento em que a democracia tem assento, junto com ela, no banco dos réus: na primeira vez, foi condenada por um tribunal de exceção. Agora, está sendo condenada por juízes que foram eleitos, como ela, e que colocam a democracia em risco.
— Por duas vezes vi de perto a face da morte: quando fui torturada por dias seguidos, submetida a sevícias que nos fazem duvidar da humanidade e do próprio sentido da vida, e quando uma doença grave e dolorosa poderia ter abreviado minha existência. Hoje, eu só temo pela morte da democracia, pela qual, muitos de nós lutamos com o melhor dos nossos esforços — disse, emocionada.
Agência Senado